quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Página em branco



Ausência. Em bom português, segundo o dicionário, é “estado ou circunstância de não estar presente”, “inexistência, carência, falta”. 

Ironicamente, há tantos tipos de ausências que, quando fui desafiada a escrever sobre ela, a primeira e mais óbvia que veio à cabeça foi a que eu conheço mais de perto: a perda de um ente amado. Mas esta é completamente descabida, pois a palavra não descreve a realidade. Por mais que eu saiba que ele não está lá, ainda posso senti-lo por perto.

Então, poderia falar da ausência de inspiração para escrever sobre um determinado assunto ou da falta de tempo para pensar e discuti-lo; sobre como sinto falta de pessoas, coisas, lugares, sensações e até do que desconheço. discorreria sobre como, hoje em dia, ausência passou de estado a status, representada apenas por uma bolinha amarela ou um reloginho no computador. E o sentimento de carência que estes símbolos suscitam quando tudo o que preciso é de presença.

Contudo, o último parágrafo teria sempre a mesma pergunta: Se ausência é falta, não presença, inexistência, como é possível que ela ocupe tanto espaço no meu coração e mente?

*Texto dedicado a um amigo com o qual fiz um brainstorming sobre o assunto e que tem uma bagagem respeitável de ausências, mas continua a busca para preenchê-las de uma forma que eu admiro. Talvez, eu devesse ter aceitado a primeira ideia dele, que era entregar uma página em branco.

sábado, 11 de agosto de 2012

Porque os 30 são os novos 30


Nem bem deu tempo de fazer o balanço dos estragos e benesses que Saturno causou e lá vem a temida troca de dezena, os 30. A primeira, na verdade, que nos coloca para pensar. Com tantos amigos me lembrando de que a minha hora está chegando, a análise prematura é inevitável.
Nos piores dias, penso que, com quase 30 anos, não sou nem a sombra do que eu sonhava/pensava que seria, teria ou faria. Nos melhores, apenas consigo pensar: “Graças a Deus!”. O que eu achava que seria minha vida aos 30, acho que nem preciso enumerar porque imagino que é o que você também imaginava para a sua quando tinha 12, 18, 25 anos. Mas aí a vida acontece... E o que eu não imaginava que seria a minha vida é o que a faz valer a pena. Com 12 ou 18 anos, não pensava que viveria nos lugares em que vivi, conheceria os lugares por onde passei, faria as escolhas que fiz, conheceria as diferentes pessoas que fazem parte da minha vida, convivendo com elas ou não. Gente que me mostrou, apenas sendo quem são, sobre as possibilidades além do caminho tradicional que a tal balzaquiana deveria seguir.
Gente que vai além do discurso de largar o que é seguro e se joga de cabeça para viver na Bahia por amor a alguém e a uma causa; gente que encara lançar uma startup num país onde o investimento é difícil; gente que faz filme; gente que escreve livros; gente que emigra porque não se sente parte do lugar e da família onde nasceu; gente que decide “viver o sonho”, como uma vez uma desses amigos definiu sua vida de viagens pelo mundo com pouca ambição e muita diversão. 
Não são só as experiências dessas pessoas que me inspiram, mas o que elas fazem de suas vidas me faz acreditar que os 30 são os novos 30. Não quero a juventude burra, a certeza vazia e petulante nem o sonho medíocre dos 20 anos. Ao nosso favor está o fato de que os 30 não são o fim de nada. É o meio. E não ser o que sonhou pode ser surpreendentemente melhor. Aos 30 já somos mais independentes financeiramente e, quase sempre, emocionalmente. Já vencemos alguns daqueles entraves de autoconfiança. Já aprendemos um pouco mais sobre nós mesmos e sobre o fato de a vida não ser um videogame que controlamos o tempo todo. Na verdade, não controlamos em momento algum.  
“Viver o sonho” pode ser qualquer coisa. Pode, sim, ser se casar, ter filhos, uma casa com três quartos e duas vagas na garagem, um casal de filhos, um emprego estável e bem remunerado e férias na praia. Mas, os trintões de hoje em dia também podem pensar em não se casar ainda, casar-se e não ter filhos, casar-se e ter enteados, casar-se de novo, investir numa carreira sólida, investir na carreira que seu pai disse que não leva a nada, trocar de carreira, não investir na carreira.
Com tantas possibilidades, também percebo o sentimento de estar um pouco perdido. Esse amigo que “vive a vida” sem a menor dúvida sobre a sua, disse-me que não existe gente perdida, só pessoas que não aceitam com facilidade as regras e sonhos padrões. Para aqueles a quem não foi concedida essa certeza ou coragem ainda, acredito que podemos não saber o que queremos, mas sabemos o que não queremos. Não sabemos para onde vamos, mas não desistiremos.  E entre uma crise e outra, vivemos a vida da forma que nos apraz!
Como uma piada pronta, esse amigo que citei continua jurando que tem 29 anos, mas sei que ele já é, pelo menos, uns três anos mais velho do que eu. Talvez por isso ele não enfrente essa tal crise...  

domingo, 15 de julho de 2012

A fábula das estações

Ela vem de um lugar em que é sempre verão, não importa a época do ano. Luz do sol radiante, calor, alegria. Um dia, ela decidiu partir para tentar conhecer as outras estações do ano das quais tinha ouvido falar.

Na primeira parada, conheceu o outono e se encantou! Em vez de tristeza pelas folhas caindo, ela viu a beleza do tapete dourado que cobria os parques, sentiu o vento já um pouco frio, mas acompanhado daquele sol de raios alaranjados no rosto.

Continuou caminhando e enfrentou o tão temido inverno... Sim, os ossos chegavam a doer e as extremidades do corpo pareciam congeladas naquelas longas noites. Sim, noites, já que nessa época o sol se encarrega de iluminar o verão que ela deixou para trás. Tempos difíceis, que podem ser visto pela sobriedade dos casacos escuros e dos rostos escondidos atrás dos cachecóis cinzentos. Até que um dia, ela acordou, abriu a porta e a paisagem tinha se transformado. A neve abafava o som e a cidade estava pacificamente branca. Por um breve momento ela conseguiu ouvir seus pensamentos com mais clareza. O que não durou muito tempo, já que alguém atirou uma bola de neve em suas costas e a brincadeira começou como se todos tivessem nove anos de idade. Talvez tenham mesmo.

A primavera, ela já sabe, é recomeço. A neve derrete e as cores começam a voltar ao seu devido lugar, assim como a esperança. Mas para ela, é o fim de um ciclo. Ela sabe que é hora de voltar para a terra do verão eterno. Percorrendo as estações, ela viu que é possível haver beleza, ainda que peculiar, no que não é senso comum. Que a perfeição não é necessária, ou que ela pode existir de acordo com os olhos de quem vê. Que assim são as estações, as pessoas, ela mesma.
O verão é demais! Mas não é a única nem necessariamente a mais bela, como a ensinaram desde pequena.

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Sense and Sensibility

Viajar para mim sempre foi mais do que sair de férias. Sempre significou conhecer, descobrir, desbravar. O lugar, o outro, eu mesma. E definitivamente, esta tem sido uma delas. Conhecer histórias de lugares e personagens que só vi nos livros da escola e, principalmente, conhecer histórias e estórias de gente. 
Hoje, brinquei com as minhas roomates que considero andar pelas ruas e ir ao pub é praticamente uma aventura sociológica e antropológica. Elas riram, mas é sério! Londres proporciona observar pessoas que vêm de todos os lugares do mundo que você imaginar. Ou não. Culturas que se refletem no modo que se vestem, que se comportam, na língua que falam. There's no place like London nesse quesito. O ônibus e o metrô são torres de Babel que me transportam não apenas geograficamente.
De algumas dessas pessoas, tenho tido a oportunidade de chegar perto na escola, em pequenas viagens, em casa, no parque.
Além de observar, ao poder ouvir um pouco, é interessante e reconfortante perceber que apesar de qualquer diferença de qualquer tipo, a ânsia de viver intensamente essa experiência nos une, ainda que por pouco tempo, como acontece na maioria das vezes. Queremos ver tudo, sentir tudo, conhecer tudo. Agora, já, right now! Mas também queremos dar um tempo do cotidiano para avaliarmos com calma o que tem sido feito de nossas vidas, o que querem que seja feito de nossas vidas e o que queremos que seja feito de nossas vidas. A conclusão é sempre que queremos o melhor. Merecemos o melhor, seja lá o que isso signifique. Nessa hora, qualquer passeio ou café se torna um divã em que compartilhamos nossos desejos, angústias, euforia, expectativas, aventuras, saudades... Todo mundo fica mais aberto. Há quem diga mais frágil.Vemos uns aos outros como num espelho, um igual, que compreende, ensina, escuta, aprende com as jornadas de cada um. É nessa hora que a gente vê que todo aquele senso comum que você ouviu antes de partir, como "é loucura", "é muita coragem", "é idiotice", transforma-se em "é vida", "é juventude". É tudo sempre muito rápido, mas muito intenso. Como é Londres. Como pode ser a vida.Assim, não é incomum que grandes amizades ou amores aconteçam. Que  fugazes amizades ou amores aconteçam. Que inesperadas amizades ou amores aconteçam. Aqui, muitas vezes, é a diferença que nos atrai.
Cada um está em busca do seu sei lá o que, sempre de passagem. Ontem, em uma das habituais despedidas, uma menina da Bulgária aprendeu a falar em português "vou sentir saudade de vocês". Pois é, o substantivo "saudade" existe apenas em português, uma vez ouvi, e compartilhei com ela. 
Às vezes, é preciso sair pra poder voltar.


*Originalmente postado nas notas do Facebook no dia 2 de outubro

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

I’m (in) London

"Take a deep breath and dive

There's a beautiful mess inside

How can you stay outside?

There's a beautiful mess

Beautiful mess inside"

(Far Far - Yaël Naïm)


Londres não é a garota mais popular e linda da escola, como Paris. Não é liberal como Amsterdam, nem sensual e colorida como Barcelona. Na verdade, sua fama é de ser cinzenta, sisuda, educada, mas fechada. Com um ar de antiga e um “que” de tradicional, representada por sua família real, construções antigas e museus. À primeira vista, é o que você vê de cima de um ônibus de turismo num feriado. Contudo, para quem tem tempo (e o privilégio) de conhecer mais do que seus pontos turísticos, ela mostra seu lado vibrante, moderno que, sim, convive nesse mesmo espaço, nesse mesmo corpo. Um corpo que abriga gente de tudo quanto é lugar, de tudo quanto é jeito.


Talvez não seja tão fácil se apaixonar por ela de cara. É preciso se dedicar a conhecê-la um pouco mais, ver mais do que o aparente caos organizado que ela apresenta. Ao se dispor a enfrentar o dia nublado e a garoa fina, sempre encontrará um lugar que te acolherá, com a sua cara. Sim, se transpassar a tal casquinha de frieza, descobrirá que ela esconde lugares incríveis que parecem que são só seus. E são mesmo.


Valerá a pena, prometo. Sua beleza é peculiar, para aqueles que vêm além...